Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos, Crítico de Arte
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Filme Lawrence da Arábia – Um clássico com graves restrições

Em primeiro lugar, o filme *Lawrence da Arábia* (1962), dirigido por David Lean, entres maiores épicos da história do cinema. Baseado na vida do oficial britânico T. E. Lawrence, que participou da Revolta Árabe contra o Império Otomano durante a Primeira Guerra Mundial, o filme apresenta imagens impressionantes, atuações marcantes e uma trilha sonora icônica. No entanto, sob a superfície de uma obra-prima cinematográfica, encontra-se uma representação controversa e frequentemente criticada dos árabes e de sua cultura.

Outrossim, a primeira questão a ser abordada é o modo como o filme trata o protagonista, Lawrence, em comparação aos personagens árabes. Embora Lawrence seja retratado como um herói complexo e enigmático, sua jornada o coloca como o salvador dos árabes, um tropeio clássico do “salvador branco”. Ele é apresentado como a figura central na revolta, enquanto os líderes árabes, como o príncipe Faisal (interpretado por Alec Guinness, um ator branco), são muitas vezes retratados como personagens coadjuvantes, incapazes de agir de maneira decisiva sem a orientação de Lawrence. Isso reflete uma visão imperialista que minimiza a capacidade e a agência dos árabes em sua própria luta por independência.

Ademais disso, a caracterização dos árabes no filme reforça estereótipos prejudiciais. Muitos dos personagens árabes são mostrados como traiçoeiros, voláteis ou brutais. O personagem de Sherif Ali, interpretado por Omar Sharif, é uma exceção notável, mas ele é mais uma figura idealizada e romantizada do que uma representação autêntica da cultura árabe. As massas árabes, por outro lado, são frequentemente retratadas de forma desumanizada, como hordas selvagens ou oportunistas, prontas para pilhar e saquear. Essas representações ecoam velhos preconceitos ocidentais sobre o “outro” oriental, alimentando uma visão eurocêntrica e hostil da cultura árabe.

Por conseguinte, o filme, posto que que tente capturar a grandiosidade da cultura do deserto e a beleza das paisagens árabes, falha em dar voz autêntica aos árabes. Ao invés disso, eles são frequentemente retratados através do olhar de Lawrence e dos britânicos, reforçando a ideia de que os ocidentais têm uma compreensão superior das complexidades da política e da guerra no Oriente Médio. Essa visão paternalista, apesar de ser comum em produções da época, perpetua a ideia de que os povos colonizados precisam da intervenção europeia para alcançar a modernidade ou a civilização.

Outro ponto importante é a romantização da violência e da guerra no contexto árabe. As batalhas são frequentemente estilizadas e celebradas, enquanto as consequências humanas para os árabes são, em grande parte, ignoradas. Há uma desconexão entre a narrativa heróica de Lawrence e o sofrimento real do povo árabe sob a opressão, seja do Império Otomano ou das potências coloniais ocidentais. Isso contribui para uma visão distorcida da história, na qual as complexidades e as tragédias do colonialismo são suavizadas ou apagadas.

Conquanto, do ponto de vista técnico, constituir-se em um filme luminoso, *Lawrence da Arábia* pode ser criticado por sua visão preconceituosa e hostil em relação aos árabes. Ele reforça estereótipos ocidentais sobre o Oriente Médio, tratando os árabes como coadjuvantes em sua própria história e glorificando a figura do “salvador” ocidental. Ao fazer isso, o filme perpetua uma narrativa colonialista que, mesmo na tentativa de homenagear os árabes, os coloca em uma posição inferior.

Em epítome, *Lawrence da Arábia* é, sem dúvida, um clássico do cinema, mas suas representações problemáticas dos árabes e de sua cultura levantam questões importantes sobre a maneira como o cinema ocidental historicamente tratou o Oriente Médio. O filme serve tanto como uma obra de arte cinematográfica quanto como um exemplo de como os preconceitos coloniais podem ser disfarçados sob o manto do entretenimento épico.

Por final, ao reavaliarmos *Lawrence da Arábia*, faz-se essencial reconhecer suas falhas ao representar os árabes de maneira justa e equilibrada.

Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos
Crítico de Arte

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