Na imponente Serra do Rio do Rastro, no sul de Santa Catarina, uma espécie pequena está ajudando a movimentar uma revolução silenciosa, a educação ambiental. Trata-se da Hysterionica pinnatisecta, carinhosamente apelidada de “margaridinha das nuvens”, uma flor endêmica e extremamente rara, que só ocorre em um trecho de menos de 800 metros ao longo da rodovia SC-390. O que antes era apenas tema de pesquisa acadêmica, agora virou centro de uma mobilização que une ciência, escola e comunidade.
A responsável por essa conexão é Júlia Gava, mestranda em Ciências Ambientais pela Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), que realiza sua pesquisa no Herbarium CRI — o Herbário Padre Doutor Raulino Reitz, localizado em Criciúma. Desde o início do mestrado, Júlia estuda a flora da Serra do Rio do Rastro e, especialmente, essa margaridinha que vive nas sombras das nuvens, em um ecossistema rochoso e delicado da encosta da Serra Geral.
“O que a gente quer mostrar para os estudantes é que o lugar onde eles vivem tem uma riqueza enorme e única. E que todos têm responsabilidade na conservação dessa natureza que está ao lado deles”, explica Júlia. Ela conduz oficinas de educação ambiental que já alcançaram mais de 400 alunos em duas ações realizadas em março deste ano, nos municípios de Timbé do Sul (SC) e São José dos Ausentes (RS), com mais uma oficina prevista para 13 de maio, que deve impactar cerca de 300 novos estudantes.
As atividades são parte de uma parceria entre a gestão ambiental da BR-285 e o PAT Planalto Sul— que atua na conservação de espécies ameaçadas, e é coordenado de forma conjunta entre o Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) e Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio Grande do Sul (SEMA). “A BR-285 e a SC-390 cortam áreas de grande valor ecológico, e essas atividades são formas de compensação ambiental que também aproximam a comunidade dos esforços de conservação”, comenta Júlia.
A jovem pesquisadora entrou para o grupo de apoio ao PAT no ano passado, após divulgar em redes sociais o lançamento de um livro ilustrado sobre a flora da Serra do Rio do Rastro. A obra, distribuída durante as oficinas, apresenta 317 espécies catalogadas em apenas seis quilômetros da serra, sendo mais de 20 endêmicas de Santa Catarina.
“Quando falamos com os estudantes sobre uma planta que só existe no território onde eles vivem, a reação é de surpresa e, muitas vezes, de orgulho. Isso desperta neles um senso de pertencimento e responsabilidade que é essencial para a conservação”, relata Júlia.
As oficinas combinam palestras, distribuição de livros, adesivos e marcadores de página com ilustrações das espécies nativas. A ideia é facilitar o acesso das crianças e adolescentes ao conhecimento científico de forma lúdica e afetiva. O projeto também busca ouvir as comunidades, fortalecendo o diálogo entre ciência e sociedade.
“A conservação de espécies ameaçadas e endêmicas é uma responsabilidade coletiva. E a gente só tem como mostrar isso para as pessoas se levarmos essas informações até elas — e também ouvirmos o que elas têm a nos dizer”, afirma Júlia.
Ações em escolas fazem parte de compromisso ambiental federal

As ações de educação ambiental realizadas nas escolas de Timbé do Sul (SC) e São José dos Ausentes (RS), que já impactaram centenas de estudantes, não são apenas iniciativas pontuais. Elas fazem parte de uma política pública estruturada no âmbito do licenciamento ambiental federal, conduzida pelo IBAMA, e representam um modelo que integra desenvolvimento de infraestrutura com responsabilidade socioambiental.
A BR-285, rodovia que corta o sul da Serra Geral e recentemente recebeu a Licença de Operação, foi acompanhada por anos por uma série de programas exigidos durante o processo de licenciamento — entre eles, o Programa de Educação Ambiental e o Programa de Comunicação Social, voltados especificamente para comunidades do entorno da obra.
Esses programas são condicionantes da licença de operação e foram moldados a partir de estudos prévios que identificaram temas prioritários, como o turismo ecológico e a valorização da biodiversidade local. Além disso, a partir de 2022, houve uma aproximação estratégica entre a equipe de gestão ambiental da BR-285 e o Plano de Ação Territorial Planalto Sul (PAT).
“A implementação dos Planos de Ação Territoriais para a conservação de espécies ameaçadas de extinção depende de articulações como essa, envolvendo distintas entidades públicas e privadas do território, como o IMA, SEMA, IBAMA, UNESC, Herbário CRI e STE, e tantas outras. O fortalecimento dessas parcerias amplifica o alcance das ações de conservação e potencializa seus resultados”, afirma Leonardo Urruth, analista ambiental da SEMA-RS e Coordenador executivo do PAT Planalto Sul.
Essa conexão foi estimulada pelo próprio IBAMA, que passou a exigir que os programas de educação e comunicação da rodovia se alinhassem aos objetivos do PAT, incorporando, por exemplo, pesquisa sobre espécies-chave, como a “margaridinha das nuvens”.
“Esses 800 metros são preciosos. Por isso, exigimos que o empreendedor — neste caso, o DNIT — realizasse ações educativas de fato significativas, que atingissem escolas, professores e os projetos pedagógicos das comunidades afetadas”, explica Cristiano Souza, analista ambiental do Ibama SC.
A execução dessas ações cabe à empresa STE — Serviços Técnicos de Engenharia, especializada em gestão ambiental de empreendimentos rodoviários, que também atua na BR-116 e na BR-290. A empresa é responsável por toda a logística das oficinas e pela articulação com as escolas.
A proposta, segundo o IBAMA, é ir além das tradicionais campanhas de datas comemorativas e construir uma educação ambiental crítica e contínua, conectada com a realidade local e que ajude a formar cidadãos conscientes do valor de seu território.
“O trabalho com escolas não é um extra. É uma obrigação prevista no licenciamento federal, especialmente para empreendimentos que impactam territórios frágeis. No caso da BR-285, conseguimos um avanço ainda maior ao integrar as diretrizes do PAT ao processo. Isso qualifica as ações e fortalece a política ambiental como um todo”, ressalta Souza.
Dessa forma, a presença da ciência nas salas de aula da Serra Geral tem sido resultado direto de uma articulação entre pesquisadores, órgãos ambientais, empresas responsáveis pelas obras e, principalmente, as comunidades locais.
Com iniciativas como essa, cresce a esperança de que jovens catarinenses passem a enxergar nas serras que cruzam diariamente um tesouro biológico ainda pouco conhecido. E que saibam, desde cedo, o valor de proteger o que é único — mesmo que seja uma simples, porém resistente, margaridinha das nuvens.
Fonte: Assessoria de Imprensa

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